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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Sou Gay e Agora?


Sou gay. E agora?

Adolescência é a fase mais complicada da vida, imagine, então, como é para quem se descobre homossexual


Bruno Senna/Esp. EM



    "Nesse tipo de situação, ouvir que alguém o aceita é o máximo", confessa Thiago Cunha, de 18 anos, assumiu ser homossexual para a mãe aos 16


    Seus amigos estão conversando sobre momentos típicos da adolescência, como o primeiro beijo, a paquera do colégio ou até mesmo um belo ator ou atriz, mas você não se sente à vontade para participar do assunto. Agora, pense como é chegar em sua casa, sentar à mesa com seus pais e não poder contar sobre uma paixonite que você não sabe se corresponde às expectativas. Essas são apenas algumas das questões vivenciadas diariamente pelo adolescente gay, que, mesmo em uma sociedade mais tolerante, ainda vivencia problemas como preconceito.  

    Bruno Senna/Esp. EM
    João Antunes mudou de colégio e se assumiu para a nova turma


    Para João Antunes, de 18 anos, gay assumido para a família e amigos, a situação é bem delicada. “Estudava em um colégio e sempre fui excluído pelos meninos. Mudei de lá por causa disso. Na nova escola, que era menor, decidi me assumir para todo mundo. Demorou uns três meses, mas foi ótimo, pois a maioria passou a me respeitar pela coragem”, afirma. 

    Essas situações de exclusão são mais comuns do que se pensa. De acordo com a pesquisa Juventude e sexualidade, da Unesco, aplicada em 13 capitais brasileiras, cerca de um quarto dos jovens não gostaria de ter um colega gay. Além disso, 35% dos pais se importariam em ter seus filhos na mesma classe que uma pessoa homossexual. 
     
    João, que acaba de retornar de um intercâmbio na Irlanda e vai prestar vestibular para artes cênicas na UFMG, notou mais tolerância em relação à homossexualidade no país onde passou um ano. “Com exceção do interior, que é bem agrícola, na Irlanda todo mundo aceita com mais naturalidade”, aponta.

    Para ele, antes de se abrir com a família, foi preciso um tempo para reflexão. “Quando tinha 13 anos, meus pais foram assistir O segredo de Brokeback Mountain. Eles chegaram do cinema e falaram mal do filme, o que me deixou com receio. Cinco meses depois, tomei fôlego e contei. A primeira reação da minha mãe foi chorar”, recorda. No entanto, com o tempo sua família se tornou uma grande aliada. “Já cheguei a levar um namorado em casa e minha mãe o conheceu.” 

    O que João fez não é hábito da maioria e a atitude nem sempre é bem acolhida. De acordo com a psicóloga Martha Gieseke Meniconi, cada caso deve ser analisado individualmente. “Primeiro, a pessoa precisa ter um trabalho individual de se conhecer melhor. Quando não há abertura em casa, o adolescente pode procurar ajuda na terapia. É um espaço para ouvir a si próprio”, opina. 

    Meniconi ainda aponta que, nos colégios, os profissionais devem ter uma postura mais ativa. “Os educadores devem estar sempre de olho para orientar. Se há sinal de bullying, é hora de instruir alunos e professores”, afirma. A psicóloga ainda salienta que a adolescência é um período de se experimentar e nem todas as experiências são definitivas. 

    “Alguns pais vão aos psicólogos atrás de uma cura para os filhos. No entanto, não estamos falando de uma doença; logo, não é preciso tratamento”, ressalta. O adolescente Thiago Cunha, de 18, é da mesma opinião de que cada caso deve ser analisado individualmente. “Se a resposta dos pais ou amigos não for positiva, a minha dica é continuar vivendo normalmente. É preciso ter paciência. Além disso, não se deve pensar que as pessoas nunca irão aceitar. É só uma questão de tempo. Tudo se acerta”, afirma. 

    Estudante do 3º ano do ensino médio e candidato a uma vaga de publicidade e propaganda, Thiago se assumiu em casa aos 16 anos e teve todo o apoio da família. “Eu já era bem resolvido desde os 11 anos, mas foi um pouco depois que tomei coragem. Cheguei em casa e comecei a tremer. Aí, perguntei o que aconteceria se eu fosse gay. Minha mãe respondeu: ‘Você não me contaria nada que eu não soubesse’.” Desde então, o relacionamento com sua família mudou. “Nesse tipo de situação, ouvir que alguém o aceita é o máximo”, diz. O jovem afirma sempre tomar a iniciativa de seus ideais e projetos. Não por acaso, é líder de classe e do colegiado.

    Para Gisely Cunha, de 35, mãe do adolescente, não foi surpresa quando ele a procurou. “Quando Thiago desabafou, eu já sabia. Havia sondado antes, mas ele precisou achar o momento certo. Na hora, disse que continuava sendo o meu filho e meus sentimentos não mudariam”, lembra. Para ela, o preconceito ainda é um problema grande na sociedade, não apenas contra gays, mas também em relação a raça, gênero e classes sociais. “Para os pais que estão na mesma situação, sempre recomendo entender o que os filhos querem. Além disso, conversem muito. Sem família é muito difícil”, salienta.

    RISCO DE SE ASSUMIR

    Bruno Senna/Esp. EM
    Hoje Thiago conta com o apoio da sua mãe, Gisely Cunha


    Mas é importante estar ciente que nem todos os pais podem ter a mesma reação de Gisely. Para Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT), é preciso cautela nesses momentos. “Não faça nada simplesmente para agredir seus familiares. Lembre-se que gentileza gera gentileza e respeito gera respeito”, diz.
        
    Militante do Grupo Universitário em Defesa da Diversidade Sexual (Gudds), com sede na UFMG, Thiago Coacci, de 22, acredita que, hoje, é mais fácil para um adolescente se abrir, mas, ainda assim, é preciso cautela. “As punições estão mais brandas. Antes, era mais comum encontrar um pai que expulsaria o filho de casa. Hoje, é mais raro se deparar com esse tipo de situação, mas ainda ocorre, mostrando que não está tão mais fácil assim.” 
        
    O ativista LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Transgêneros) e estudante de direito sinaliza que, antes de verbalizar a orientação sexual, é preciso analisar cada caso. “Para mim, sair do armário é algo importante. Mas compreendo que o armário também pode ser uma saída. Algumas pessoas correm sérios riscos e, para elas, realmente não recomendo que se assumam”, desabafa. 

    De acordo com Reis, é preciso maturidade para conversar com familiares e amigos. “Leia bastante sobre o assunto para que esteja bem informado. É preciso estar seguro do que você é para poder se assumir. Sempre pense nas vantagens e desvantagens”, aponta. E para as situações de saia justa nos colégios, o presidente da ABGLT é enfático. “O que os outros falam de você é problema deles, mas o que você faz com o que falam de você é problema seu. Por isso, é bacana ter autoestima, ou seja, se gostar, ter autoconfiança e uma imagem legal de si próprio”, complementa. 

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